A decisão da União Europeia de restringir importações e dobrar tarifas marca uma guinada na política industrial do bloco, além de expor o contraste com a falta de estratégia produtiva em economias que ainda hesitam em agir.
A União Europeia voltou a falar o idioma da indústria. Diante da perda de 18 mil empregos diretos em 2024 e da escalada do aço chinês de baixo custo, Bruxelas anunciou em 7 de outubro um pacote robusto de medidas visando a preservação da produção siderúrgica local.
O programa inclui mudanças no sistema atual de cotas de importação. O volume isento de tarifas será reduzido em 47%, para 18,3 milhões de toneladas anuais. As tarifas sobre volumes excedentes, por sua vez, dobrarão de 25% para 50%.
Além disso, importadores deverão comprovar onde o aço foi fundido e moldado, ou seja, uma forma de conter a triangulação e garantir transparência na cadeia.
As medidas apresentadas ainda deverão ser aprovadas pelos países membros da UE e pelo Parlamento Europeu e devem substituir o sistema vigente a partir de 1º de julho de 2026. Se aprovada,a União Europeia se juntará aos Estados Unidos e Canadá, que vem aplicando medidas mais restritivas para a importação de produtos siderúrgicos.
Mais do que uma reação conjuntural, a medida revela crescente importância da defesa da indústria
A Europa entendeu que competitividade não nasce apenas de eficiência técnica, mas também de visão estratégica e política industrial consistente. O bloco, que amargou a queda da produção de 196 milhões de toneladas em 2019 para 174,7 no ano passado (dados do Instituto Aço Brasil), tenta reconstruir sua soberania produtiva diante de um cenário global dominado por um bilhão de toneladas produzidas pela China anualmente. O país asiático produz mais da metade de todo o aço mundial e vêm exportando volumes crescentes, após a redução de consumo por parte do seu setor imobiliário.
Na leitura da Abimetal-Sicetel, essa decisão da UE não é sobre tarifas, mas sobre projeto de futuro
Ao proteger suas siderúrgicas, a Europa busca garantir capacidade de investimento, inovação e descarbonização, pilares da reindustrialização verde que conecta emprego, tecnologia e sustentabilidade.
Enquanto isso, o Brasil permanece num ponto de inflexão: com um parque industrial pressionado, altos custos estruturais e mecanismos de defesa comercial pouco dinâmicos, corre o risco de ficar à margem da reorganização global do setor.
O que a Europa fez foi recolocar o aço no centro da estratégia econômica?
E a mensagem é clara: o mundo está reposicionando suas cadeias produtivas e valorizando a manufatura como ativo estratégico. Para o Brasil, é hora de olhar além da proteção e pensar em protagonismo, é hora de transformar o aço em vetor de desenvolvimento, e não apenas em indicador de sobrevivência.